“Obscured by Clouds” é o nome perfeito para o sétimo álbum do Pink Floyd. Isso porque, lançado em 2 de junho de 1972, ele ficou ofuscado e não teve muita atenção do público, mas deveria. Antecede a inegável obra-prima “The Dark Side of the Moon” de 1973, mas tem sim um grande valor musical. Ele foi gravado entre Fevereiro e Março de 1972, no Strawberry Studios, em Château d’Hérouville, na França.
A intenção do “Obscured by Clouds” foi para ser uma trilha sonora do filme “La Vallée” do diretor Barbet Schroeder, com quem eles já tinham trabalhado anteriormente em 1969. O filme narra a busca de um vale mítico, localizado em Papua Nova Guiné, pela esposa de um diplomata francês. Sendo assim, o primeiro título seria “The Valley”, mas houve um sério desentendimento da produtora com a banda e eles escolheram um novo nome. O tempo das músicas é harmônico, visto que os 106 minutos são bem distribuídos e variam de 2 a 5 minutos. Nada como o anterior que tinha “Echoes” com mais de 23 minutos.
Obscured by Clouds
A música título tem apenas 3 minutos, e é instrumental. Começa com uma nota persistente tocada no sintetizador, dando um ar especialmente dramático quando se pensa em trilhas sonoras. O som é crescente, a bateria começa suavemente marcando o tempo de maneira repetida e continua assim até o final. Logo é seguida pela guitarra, que só dá as caras mesmo lá perto do primeiro minuto, mas David Gilmour é David Gilmour, e fica até difícil escolher uma palavra para descrever. É tão bonito e tão rápido que quando se fecha os olhos para ouvir melhor, já acabou. E aí, é possível fazer uma metáfora com o resto do álbum, “Obscured by Clouds” passa tão rápido quanto uma nuvem encobrindo o sol. Você fica uns segundos confuso porque jura que a música acabou, mas parece que ela continua mesmo assim. É quase uma emenda com a próxima faixa.
When You’re In
Mas aí dá para dizer que “Obscured by Clouds” é uma introdução de “When You´re In” ou que “When You´re In” é uma continuação de “Obscured by Clouds”? Não! A primeira tem uma pegada bem mais psicodélica e melancólica. A segunda música do álbum já tem a bateria um pouco mais pesada. O teclado de Rick Wright se destaca aqui trazendo mais cor à “When You´re In” a partir dos 40 segundos. OK! Não dá pra dizer que ela é um primor do Pink Floyd e muito menos de “Obscured by Clouds”, ela é curtinha, com 2 minutos e meio.
Burning Bridges
A terceira música é a cara do Pink Floyd e podia muito bem fazer parte do icônico “The Dark Side of the Moon”. Isso porque “Burning Bridges” tem uma pegada que lembra muito “Breathe”. Traz uma nostalgia que você nem sabe do que. A guitarra e a bateria formam uma dupla circular que é complementada pelo vocal alternado de Gilmour e Wright, que é mais uma declamação da letra, complementando esse círculo infinito e melancólico. A letra é extremamente poética, outra marca registrada da banda. “Pontes queimando alegremente/Fundindo-se com as sombras/Agitando-se entre as linhas.”
The Gold, It’s in the…
“The Gold, It’s in the…” foge um pouco do progressivo e segue a linha do rock clássico, quase um The Who. Ela é mais animada e simples, sem a complexidade característica de Pink Floyd. A letra fala de uma jornada em busca de algo, possivelmente ouro, como diz o título. “Tudo que eu quero te falar, tudo que eu quero dizer / É que conte comigo nesta jornada / Não ache que eu irei ficar aqui.”Então, a música condiz muito com a excitação pela aventura, trazida pela mensagem na letra. Gilmour entra com um solo lá com 1 minuto e meio de música.
Wot’s, Uh…the Deal?
Essa talvez seja a música que mais sintetize a ideia principal do filme: a busca por si mesmo. “O Céu mandou a terra prometida/Tudo parece bem de onde eu estou/Porque eu sou o homem no lado de fora olhando para dentro.” A música começa com a melodia na guitarra e uma bateria suave. O vocal é bem intimista, quase um “voz e violão”, se não fosse Wright surgindo com um solo lá pelos 2 minutos e meio, que agrega ainda mais beleza para a música.
Mudmen
“Mudmen” é instrumental e traz o mesmo tema já apresentado em “Burning Bridges”. A questão aqui é que ela é mais trabalhada e com uma maior experimentação. Ela começa com Wright desenvolvendo a melodia, com uma sonoridade forte de órgão (daqueles de igreja mesmo!). Gilmour entra com um solo belíssimo lá por 1 minuto e meio, um agudo distorcido que quase representa um vocal. E se segue daí até o final dos 4 minutos uma complementação da guitarra distorcida e o órgão psicodélico.
Childhood’s End
A sétima música do sétimo álbum traz uma sensação de números cabalísticos. E “Childhood’s End” começa quase como uma trilha de suspense, mas só até o primeiro minuto, quando vai evoluindo em crescente até o momento do vocal de David Gilmour. Destaque para a percussão, que dá uma ideia do que ainda virá. A questão que fica aqui é, seria uma prévia de “Time”? Porque ela fala da questão do tempo e tem a sonoridade bem parecida. “Você navega além dos mares/De pensamentos e memórias que se foram/A infância acabou, suas fantasias/Se unem à dura realidade.”
Free Four
A música começa com um trocadilho em relação ao nome: “One, Two, FREE FOUR”. Quem faz o vocal aqui é Roger Waters, e a letra fala da morte de seu pai.“Mas você é o anjo de morte/E eu sou o filho do homem morto/Ele foi enterrado como uma toupeira em um buraco/E todo mundo ainda está na corrida”. Apesar de a letra ser triste e pesada, a sonoridade é leve e de uma certa alegria. Conformismo, talvez? Quase todos os fins de estrofes terminam com pratos de bateria, dando uma certa dramaticidade ao som. Um pequeno solo de guitarra distorcida lá por 1 minuto e meio e um mais longo depois com três minutos.
Stay
“Stay” é uma balada em que predomina o piano de Wright. “Fique e me ajude a terminar o dia/ E se não se importar, abriremos uma garrafa de vinho./ Fique por perto, e talvez a gente consiga terminá-la toda”. A música fala sobre uma noite só. “Vasculho minha mente tentando lembrar teu nome/ Para achar as palavras certas pra dizer adeus.” Com dois minutos e meio, surge um belíssimo (tá repetitivo?) solo de guitarra, com uma pegada meio blues.
Absolutely Curtains
A instrumental “Absolutely Curtains” é a mais experimental do álbum. Ela termina com o canto, apresentado no filme, da tribo Mapuga da Nova Guiné.
Pode não ser um dos álbuns icônicos, mas faz uma mistura da variação musical do Pink Floyd, que foi desde um som experimental a um mais comercial (“The Gold, It’s in the…”). “Obscured by Clouds” é um excelente petisco antes de “The Dark Side of the Moon”.
Formação:
David Gilmour – Guitarra, Vocal
Rick Wright – Teclado, Vocal
Roger Waters – Baixo, Vocal
Nick Mason – Bateria, Percussão
Faixas:
1.Obscured by Clouds
2.When You’re In
3.Burning Bridges
4.The Gold, It’s in the…
5.Wot’s, Uh…the Deal?
6.Mudmen
7.Childhood’s End
8.Free Four
9.Stay
10.Absolutely Curtains
*publicado originalmente em 09 de fevereiro de 2018, em Roadie Metal.